A Bíblia Não-Escrita da Umbanda: Formas de Apresentação

O caboclo brasileiro representa a força e a simplicidade. (Foto: Google Imagens)
Por Aralotum

A Umbanda é um universo recheado de conhecimento simbólico, de analogias e sincretismos. Ela não se expressa por uma linguagem formal e metódica, mas sim por exemplos que são facilmente assimilados por qualquer pessoa livre de preconceitos. É como uma parábola, mas uma parábola viva. Dessa forma, a Umbanda se torna acessível a qualquer pessoa.

Nesse universo simbólico podemos compreender a natureza dos nossos entes espirituais. Seus nomes, formas de apresentação, sinais riscados e pontos cantados identificam uma parte de quem eles são e do trabalho que exercem no astral. Neste contexto, a Umbanda transmite seus ensinamentos e sua doutrina através da vivência, muitas vezes, inconsciente. E àquele que é apto a compreender esse sistema, o faz gradativamente, de acordo com o nível de desprendimento e consciência que possui das coisas espirituais.

Posto isso, é correto afirmarmos que os espíritos, na Umbanda, não se apresentam como eles são, mas sim da forma como eles querem que nós os vejamos. Essa forma reflete, em parte, o trabalho e a atuação deles no astral. É importante frisar que a Umbanda abre portas para espíritos de vários graus evolutivos fazerem seu trabalho de caridade. Alguns deles são espíritos muito antigos que foram condutores da raça humana em diversos períodos da história contada e não contada. Outros são espíritos muito simples, que em períodos mais recentes da história faziam parte de comunidades tradicionais. Há, ainda, seres elementares e espíritos tão puros e elevados que tiveram pouquíssimas ou nenhuma encarnação e que, mesmo assim, “baixam” só para nos ajudar em nosso caminho evolutivo.

A verdade é que, para eles, isso é pouco relevante para a realização do trabalho de caridade ao qual cada um está subordinado. Em relação a nós, no trabalho de caridade no terreiro, importa mais o trabalho espiritual de cada um do que o seu grau evolutivo, sua função no astral ou a importância que teve quando em vida. De fato, um espírito superior pouco importa para essas coisas, ele entende que não precisa se apresentar dessa forma e usa a roupagem fluídica de caboclos, pretos velhos, crianças, exus e encantados.

Quando falo “roupagem fluídica”, é porque os espíritos do astral tem a capacidade de moldar seu corpo astral ou perispírito. Dessa forma, eles podem assumir a aparência que mais lhe convém, de acordo com seu grau de evolução e desprendimento da matéria. Assim, na Umbanda, eles se manifestam como figuras simbólicas, transmitindo na própria imagem o ensinamento espiritual.

As figuras de maior destaque neste cenário são as crianças, caboclos, pretos velhos e exus. Lembrando que o espírito não é isso, ele apenas se manifesta com essa forma, com essa roupagem. Ou seja, a criança não é o espírito de alguém que morreu na infância, o caboclo não é um índio e o preto velho pode não ser preto, e nem velho. Eles são espíritos comuns e apenas se manifestam assim, usando essas figuras arquetípicas do imaginário popular, para poderem serem melhor compreendidos.

A criança representa o início do ciclo, a alegria e a pureza. O índio caboclo representa o ciclo intermediário, a vida adulta e transmite a ideia de simplicidade e força. O preto velho representa a senilidade, o final do ciclo e transmite a ideia de humildade e sabedoria. Não é preciso muito estudo para compreender esses significados e tomá-los como exemplos do comportamento cristão, de como devemos ser (alegres, simples e humildes) e do que alcançaremos quando assim formos (a pureza, a fortaleza e a sabedoria).

O  Exu representa a vida inconsciente, o ser oculto e está relacionado com a libido, a sexualidade, a fertilidade e a realização. Eles são os que trabalham mais próximo dos seres humanos e, por isso, se manifestam como tais, como um espelho da humanidade. Nos faz lidar com nossas falhas, nossos vícios, nossas ansiedades. Talvez, para mostrar que a nossa própria condição de humanidade também é sagrada.

Ainda há a manifestação de espíritos em estágio elementar, que habitam entre os reinos da natureza e a humanidade. São espíritos que ainda não completaram o seu ciclo elementar e possuem pouquíssimas ou nenhuma encarnação. São os marinheiros, baianos e boiadeiros, que representa as mesmas coisas que as entidades citadas anteriormente: o início do ciclo ou da vida (o mar), o intermeio entre a vida e a morte (a baía, espaço recôncavo entre a terra e o mar; praia) e o final do ciclo ou da vida (a terra/sertão).

Os elementares são espíritos muitos específicos em seus trabalhos e apresentação. Dessa organização surgem as famílias dos malandros (Zé Pelintra, Maria Padilha e outros), que se assemelham aos trabalhos dos Exus: próximos aos problemas humanos, ao cotidiano urbano e a marginalidade social; os mineiros (das minas); os mouros; os ciganos; e outras famílias espirituais ligadas às manifestações da natureza, da vida mineral, vegetal e animal.

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