A Bíblia Não-Escrita da Umbanda: Pontos Cantados

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(Fonte: Google Imagens)

Outra forma por onde os Espíritos transmitem o seu conhecimento é através dos cânticos sagrados, chamados pontos cantados. Esses cânticos ainda constituem verdadeiros mistérios dentro da Umbanda e é preciso certo grau de conhecimento sobre os símbolos usados no terreiro para traduzir e interpretar esses cânticos adequadamente. Todavia, todo ponto-raiz cantado no terreiro tem um significado esotérico que está oculto e traduz, de maneira simbólica, algumas verdades espirituais através da sua letra.

O ponto cantado é de extrema importância na vivência do terreiro. Principalmente, porque o cântico é, antes de tudo, uma oração. Nós atraímos e enviamos forças através desses cânticos, chamamos e entramos em contato com várias classes de espíritos e ainda aprendemos sobre as entidades e os seus trabalhos.

Talvez o ponto cantado seja a melhor forma de transmitir a doutrina umbandista em massa, pois ele é usado dentro e fora do terreiro. Na rua, quando estamos caminhando ou quando precisamos fazer algum pedido é muito saudável cantar os pontos daqueles Espíritos amigos que nos protegem e nos guardam.

A questão mais importante, porém, é compreender o ponto e entender o que ele está dizendo . E isso nem sempre é fácil, pois a mensagem real está, muitas vezes, ocultada nos significados mais profundos e abstratos do ponto cantado. É importante lembrar que na Umbanda tudo tem um simbolismo próprio que nos traz mais informação do que aquilo que está sendo mostrado – ou cantado – literalmente.

Dessa forma, um ponto cantado tem pelo menos três compreensões distintas: (1) a compreensão literal; (2) a compreensão simbólica; (3) e a compreensão mística. A compreensão mística é aquela que diz respeito à manipulação da força mágica e que, em determinadas circunstâncias, pode atrair ou afastar determinadas forças espirituais, energias ou espíritos.Não vamos entrar nesse terceiro ponto.

O que nos interessa é a relação entre a compreensão literal e simbólica do ponto cantado, e para começar a entender essa relação nós precisamos conhecer alguns simbolismos usados nos terreiros. Claramente não dá pra abordar esse assunto de maneira profunda aqui, mas vamos citar alguns exemplos introduzir ao assunto:

Mata virgem: A Mata Virgem é um termo muito usado nos cânticos do terreiro e designa o plano espiritual em si. Nas tradições yorubanas e no Culto Ifá, esse mesmo simbolismo aparece como Ìgbó – A Floresta Sagrada. O símbolo da mata ou floresta pode ser crucial importância, pois, é um ambiente selvagem e cheio de mistério, é de lá que saem os remédios e os venenos (aquilo que cura e o que mata, a forças  do bem e do mal), é lá que os homens iam buscar a caça e o alimento. Enfim, é a origem e forte de manutenção dos mistérios da vida, assim como é o mundo espiritual.

Pena: A palavra Pena aparece em muitos pontos cantados e nem sempre (quase nunca) diz respeito às penas de pássaro, também pode ser pena de penar, de penitência. E quando você passa a olhar essa palavra de uma outra maneira, começamos a compreender melhor o que as entidades realmente querem dizer nos seus pontos.

Aruanda: Essa é uma palavra que é muitas vezes entendida e confundida como “céu”, no seu sentido espiritual. No entanto a tradução correta não esta. Aruanda é, antes de tudo, uma região no astral – e não o astral em si – uma espécie de cidade ou lugar aonde os os espíritos habitam, de onde vem ou são ordenados. Aruanda vem de raízes vocálicas muito antigas. A palavra pode ter sido facilmente inspirada – para o nosso entendimento – nas palavras de origem bantu “Ruanda” e “Luanda”, nomes de um país e uma cidade africana, respectivamente. Segundo a raiz arquaeométrica da palavra, Aruanda poderia vir de Aryanda, o Conjunto/Grupo/Coletivo dos Aryas, homens precursores da doutrina bramânica da Índia e do zoroastrismo iraniano; o significado de “Arya” é “aquele que descende de uma família nobre”, “de comportamento gentil e refinado”, “de bons modos e de conduta reta”, por fim, Arya adjetiva um ser honrado, nobre ou respeitável, podendo, por vezes, significar “mestre” ou “sacerdote”. Segundo a raiz tupi, do Abanheenga, Aruanda poderia ter vindo de “Arauanda”, que significa, literalmente, “Terra da Luz” ou “Casa da Luz”.

Jurema: Jurema é uma palavra indígena que, hoje, identifica uma bebida ritualística feita com partes de uma planta que recebe o mesmo nome. Mas é, também, o nome de uma falange de bons espíritos (Cabocla Jurema e Caboclo Juremá) e um dos reinos da encantaria (o Juremal ou Juremá) presente no Catimbó e nos cultos chamados de Adjunto de Jurema, que são cultos que usam a Jurema como bebida ritualística, preparada de várias formas, além de também ser nome de um espírito encantado que baixa nesses cultos (o Mestre Juremá). De fato, a Jurema e seus usos preparações e etc. envolve muito mistério, e é tido que ela traz uma “ciência”, no sentido do saber, de conhecimento. Então é uma palavra que pode ter muitos significados. Quando um Caboclo diz que “foi à Jurema” ou “foi ao Juremal”, pode significar que ele vai ao reduto do seu conhecimento tradicional no astral, buscar a sua “ciência”; mas também pode significar que ele vai à essa região ou reino encantado da Jurema, do Juremá ou do Juremal. Da mesma forma, quando ele diz diz “que vem da Jurema”, pode significar que ele, literalmente, vem desse reino encantado ou faz parte das falanges da Cabocla Jurema ou do Caboclo Juremá. São particularidades trazidas por cada entidade, aonde o contato real e verdadeiro com ele, junto a soma de outras particularidades formam um todo que ajuda a compreender quem é este espírito de fato.

 

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